Entrevista: André Mehmari
Músico de reconhecimento internacional é um dos professores do 10º Festival Internacional Sesc de MúsicaUm dos mais reconhecidos pianistas e compositores brasileiros, André Mehmari está no 10º Festival Internacional Sesc de Música. Com apenas 15 anos, Mehmari já havia criado mais de 200 peças musicais. Como intérprete, se destaca na improvisação. Versátil, transita por diversos estilos musicais. Além de apresentação com a Banda Tun Tóin Foin, de Arthur de Faria, realizada na quarta-feira (22/01), está presente durante todo o Festival atuando como professor de composição. Em entrevista, ele fala sobre a experiência de participar pela primeira vez do evento, em Pelotas.
Como está sendo a sua primeira participação no Festival Internacional Sesc de Música?
Estou me ambientando. No primeiro dia, fiz o encontro com os alunos, conheci o jeitão de cada um. Estou conhecendo os professores que estão aí. Alguns amigos eu conheço de longa data, como o Horácio (Schaefer), da viola, que tocou obras minhas em 2001 ou o Emmanuele (Baldini) que toca desde 2005 as minhas obras. O nível do Festival é estratosférico, conduzido com muita competência e profissionalismo. O Brasil precisa muito disso. É um festival modelo para ser copiado em outras partes do Brasil. Conduzido com muita paixão e seriedade, necessário para realizar algo dessa magnitude.
Há alunos bem novos, inclusive integrantes de orquestras jovens e comunitárias, que estão participando do evento. Para você, como foi esse despertar musical?
Eu acho que essa fagulha musical surgiu na minha vida muito cedo. Eu tive um ambiente musical em casa e virei profissional muito cedo, com 11 anos de idade. Mas decidi que seguiria a música por volta dos 13 ou 14 anos. Foi quando disse que não poderia ter outra profissão que não seja a música.
E quais os desafios que aguardam os jovens que tomam essa mesma decisão?
É uma profissão extremamente complexa e difícil. A vida do artista envolve muito estudo, muita persistência e você nunca vai chegar aonde você quer. Essa é uma garantia que você tem. Um músico sério nunca vai chegar onde ele quer chegar, ele sempre vai querer mais, sempre evoluindo, estudando. Ele vai ter 80 anos e vai estar inquieto, achando que o concerto não foi bem. Nesse sentido, é uma profissão ingrata, mas ao mesmo tempo muito linda, porque a música é infinita. Como compositor, as minhas referências são semideuses. Eu não tenho só mestres, tenho grandes figuras que deixaram uma obra transcendente. Então a gente tem que buscar evoluir, crescer, interagir e um festival como esse dá as condições ideais para isso.
Certamente, o Festival desperta essa fagulha em muitos jovens. Quais as referências que não podem faltar na playlist deles?
Eu acho que o fundamental não é o que ouvir em termos de repertório, mas o que vão ouvir em termos de comprometimento. Músicos de fato apaixonados pelo que fazem inspiram as pessoas nesse caminho. Um jovem músico que está vendo alguém grande na carreira, alguém que realmente ama o que faz, ele vai inspirar se inspirar a ser igualmente sério e comprometido na sua arte. Não é o que ele vai ouvir, é o modo como a música é feita. Se ele vai ouvir uma moda de viola ou a nona de Mahler, não importa, o que importa é o comprometimento com a arte e com o sagrado, que é a transmissão dessa arte.
Como conciliar estilos tão diferentes?
Isso sempre foi uma característica da minha postura musical, ouvir músicas diferentes na minha vitrola, no piano, e nunca com uma etiqueta dizendo “aquilo é clássico, aquilo é popular” ou “isso é alto ou isso é baixo”. Por isso, eu desenvolvi um senso musical bastante crítico desde sempre, escolhendo aquilo que eu queria e o que não queria para mim de acordo com os meus próprios critérios. Não é porque eu tenho esse trânsito entre os estilos todo que eu sou uma pessoa tolerante, até bem pelo contrário, eu sou muito exigente. Mas reconheço que a música boa está em toda parte. Ela não está em um único meio, não está só na música de concerto, ou na música europeia ou na música erudita. Ela está em diversas tradições, inclusive tradições não ocidentais. Eu estudo a música indiana que é riquíssima, uma música clássica belíssima, cheia de profundidade. Estudo música do Oriente Médio também. Eu acho que a música é a melhor amiga do homem. Ela ajuda a humanidade a caminhar por um momento mais luminoso. Meu credo é que a música tem o poder de aproximar as pessoas através do som, que é energia. Acredito que a música nunca vai fazer nenhum dano na vida das pessoas, vai ser sempre algo que vai aproximá-las, vai trazer um encontro em torno de uma coisa que acalenta o espírito e aproxima as pessoas. Isso é algo que vi muito claramente nas minhas viagens a vida inteira.